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Rede Formativa Peirô

Quando o Papel Ganha Vida: um encontro entre arte, infância e imaginação

Atualizado: 6 de dez.

Texto de Bruna Nathália Alves da Silva



1. Quem sou eu e de onde vem essa história


Você já parou pra pensar quantas histórias cabem dentro de um boneco? Pois é… Eu também não imaginava até me apaixonar por esse universo. Sou Bruna Nathália Alves da Silva, formada em Teatro Licenciatura pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Logo no início do curso, tive a sorte de conhecer a professora Rossana Perdomini Della Costa Vellozo, que me apresentou à disciplina optativa de Teatro de Formas Animadas — e, junto com ela, a um novo mundo de possibilidades. Foi nessa disciplina que fiz meu primeiro boneco de papel machê e aprendi todo o processo: preparar a massa, modelar, esperar secar, pintar e, enfim, ver a criação ganhar forma. A cada etapa, me encantava mais com a ideia de dar vida a algo inanimado.


Durante a pandemia, fui bolsista do PROLICEN, num projeto que buscava levar o teatro a alunos sem acesso à internet. Criamos materiais de teatro de formas animadas para rádio e TV, aproximando a arte de quem mais precisava. A partir dali, o encantamento virou pesquisa, formação e propósito. Fiz cursos — inclusive com o grupo Peirô — e compreendi o poder transformador dessa linguagem.


2. Quando o teatro encontrou a escola


Diversas marionetes feitas pelos alunos em close-up.
Bonecos feitos pelos alunos e alunas.

Em 2024, retornei à minha cidade para lecionar Artes na rede municipal. Foi ali que decidi trazer o teatro de formas animadas para dentro da sala de aula. A maioria dos alunos nunca tinha visto algo assim. Vivendo em uma cidade pequena, com pouco acesso a espetáculos e oficinas, o que eles conheciam era o fantoche da infância — aquele que, ao crescer, vira “coisa de criança”.


Além disso, os professores anteriores vinham das Artes Visuais, então o foco sempre esteve no desenho e na pintura. Logo no início, contei a eles que minha formação era em Teatro, e os convidei a se permitirem viver algo diferente.



3. Um passo de cada vez: das sombras aos bonecos


Com as turmas de 8º e 9º ano, iniciamos uma verdadeira jornada pelas linguagens do teatro de formas animadas. Começamos pelo teatro de sombras, experimentando as silhuetas dos objetos e de nossos próprios corpos. Depois, trabalhamos com palitoches e com o teatro na caixa de sapato, pequenas cenas dentro de um espaço íntimo.



Seguimos explorando o stop motion, animando objetos e massinhas de modelar, dando vida ao que antes parecia estático. Cada etapa era um novo desafio, um exercício de imaginação e paciência. Tudo isso foi preparando o caminho para o grande momento: a confecção dos bonecos de papel machê.


Animação Stop-motion com bonecos e cenários de massa de modelar.

4. Mãos na massa: a confecção dos bonecos de papel machê


Deixei os bonecos por último de propósito. Queria que, antes, os alunos aprendessem a enxergar vida no impensável — uma colher, uma xícara, um pedaço de pano. Só então chegamos ao boneco, que, por natureza, já nasce cheio de personalidade.


Começamos pesquisando sobre o Teatro de Bonecos Popular do Nordeste, reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. Os alunos ficaram encantados! Descobriram mestres mamulengueiros, assistiram a vídeos e leram sobre os grupos e artistas que mantêm viva essa tradição.


Depois veio a parte mais divertida: pôr a mão na massa. Desenhamos os bonecos, escolhemos cores, expressões, e iniciamos a produção do papel machê. Rasgamos, trituramos, misturamos com cola e começamos a modelar. A escola virou um ateliê barulhento e cheio de risadas — e de dedos grudando de cola.



Optamos por fazer bonecos de luva, pequenos, devido aos recursos limitados. Modelar o rosto foi o maior desafio. “Como faz um nariz?”, “E a boca, profe?”, “Tá parecendo comigo?” — as dúvidas surgiam junto com a empolgação. Aos poucos, foram perdendo o medo de ousar. Repeti a eles uma frase que aprendi com a professora Rossana:“Cada boneco que a gente faz carrega um pouquinho da personalidade de quem o criou.” E assim foi. Cada um com seu jeito, seu traço e seu afeto impresso na massa.


5. Costurando histórias e dando vida


Depois da modelagem, veio a pintura — o toque final. Alguns alunos optaram por papietar para suavizar a textura; outros preferiram manter o aspecto rústico do papel machê. Usamos tintas, lã, tecidos, o que estivesse ao alcance.


Em seguida, enfrentamos outro desafio: costurar. Poucos sabiam, então ensinei um a um. Espetaram os dedos, erraram nós, riram dos próprios erros, e no fim cada boneco ganhou sua própria roupa — cheia de estilo e significado.

Com tudo pronto, chegou a hora de dar vida aos bonecos. Criamos histórias, ensaiamos vozes, movimentos, ritmos. Ver os adolescentes mergulhando na brincadeira, reencontrando a infância e se emocionando com as criações foi um dos momentos mais bonitos que vivi como professora. Apresentaram-se para as turmas dos anos iniciais — e foi mágico!




6. A caixa que carrega sonhos


Alguns alunos quiseram levar seus bonecos para casa. Outros deixaram comigo, pedindo que eu continuasse usando-os nas aulas. Assim nasceu a Caixa de Bonecos, que hoje viaja comigo pelas escolas. Dentro dela cabem infinitas histórias, jogos teatrais, dramatizações, oficinas e possibilidades de criação. Cada boneco guarda um fragmento de quem o fez — e, quando o utilizo com as turmas menores, sinto que a arte segue circulando, viva e pulsante.


Um mamulengo-gatinho confeccionado pelos alunos.

7. Da sala de aula à Feira do Livro


Em 2025, os alunos receberam um novo desafio: representar a vida e a obra de Érico Veríssimo na Feira do Livro Municipal. E adivinha qual foi a primeira ideia deles? “Profe, vamos fazer bonecos de papel machê dos personagens!”Assim fizeram — e ainda criaram uma baleia gigante, inspirada em uma das histórias do autor, que virou o destaque da exposição. Foi lindo ver o quanto a experiência anterior havia marcado e inspirado novas criações.


8. Quando o aprendizado se transforma em encantamento


Bonecos de porquinhos e um lobo em uma estante com livros.
Bonecos da história "Outra vez os Três Porquinhos", de Érico Veríssimo.

Hoje, olhando pra trás, percebo que o que começou como uma simples confecção de bonecos se transformou em algo muito maior. Foi um processo de autoexpressão, memória e pertencimento. Cada boneco, cada costura, cada apresentação representou um gesto de coragem e criação.


O teatro de formas animadas me ensinou — e ensinou aos meus alunos — que a arte não está apenas nas mãos, mas também no olhar e no afeto que colocamos em cada gesto. E, no fim das contas, o papel machê realmente ganha vida… quando o coração de quem o cria está inteiro no processo.






9. O que disseram os alunos


Maria Clara, 9º ano

“Eu nunca tinha feito um boneco de papel machê. Foi muito legal ver o boneco pronto e perceber que parecia ter vida. Quando a gente ensaiava as falas e mexia os bonecos, eu me senti dentro de um filme.”


Matheus, 9º ano

“Eu achei que teatro era só pra quem gostava de atuar, mas vi que tem muita coisa por trás, tipo criar cenário, fazer os bonecos e pensar na história. Gostei mais da parte de montar os personagens, porque usei pedaços de coisas que iam pro lixo. Foi legal ver que dá pra transformar isso em arte.”


Andressa, 8º ano

“Eu amei fazer meu boneca. Quando a profe falou que cada boneco tem um pedacinho da gente, eu entendi o que ela quis dizer. Aprendi que a arte faz a gente se enxergar de outro jeito.”


Tayane, 8º ano

“No começo eu não queria participar, achei que era coisa de criança, mas depois gostei muito. A gente ria, ajudava um ao outro, e no final ver o trabalho pronto foi demais. Mostrei pro meu irmão e ele pediu pra fazer um boneco também.”


Roberta (Mãe do Pedro): Oi Profe Bruna, tudo bem? O Pedro amou o fantoche que vocês fizeram sexta na aula. Ele anda pra cima e pra baixo e fala que o nome é José e é o filho dele. Uma forma dele sentir que tem um amigo sempre junto. Muito obrigada! 


Fotos: acervo de Bruna Nathália Alves da Silva



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