Experimentações com Bonecos na Educação Infantil
- projetopeiro
- há 2 dias
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Texto de Ana Emília da Rosa Kessler
Os bonecos muitas vezes já estão presentes na Ed. Infantil, sejam eles miniaturas de personagens, fantoches de feltro, barbies, etc. O real desafio é pensar em bonecos que fujam dos padrões e se alinhem com perspectivas educacionais menos tradicionais, dando espaço para o protagonismo infantil.
No meio do primeiro semestre de 2025 assumi como pedagoga uma turma já em andamento, na rede municipal de uma cidade pequenininha no interior do Rio Grande do Sul. A cidade tem apenas uma escola de Educação Infantil, acolhendo um público bastante diversificado. A minha turma é composta por 14 crianças, com idades mistas, entre 2 e 4 anos.
O processo de adaptação com uma nova turma exige um olhar atento para conhecer os pequenos, entender suas preferências e as dinâmicas da turma, e o mais importante: criar laços. Aqui que entraram os bonecos (juntinho com a literatura)!!! Com uma turma com características tão variadas, incorporei na prática semanal a contação de histórias, buscando fugir um pouquinho de usar apenas os clássicos, e dar espaço para uma literatura infantil diversificada, brincando com a criatividade. O que venho contar aqui está relacionado a duas propostas desenvolvidas com a turma ao longo do primeiro mês de contato.

A primeira proposta foi mais simples: contei a história “O coelhinho que não era da páscoa”, de Ruth Rocha. Conversamos sobre o que algumas famílias faziam como o trabalho/ profissão dos familiares e algumas crianças compartilharam suas experiências e referências, falando do “serviço” de seus responsáveis.
Na mesma semana, disponibilizei no espaço da sala da turma fantoches de boca articulada para a turma, relacionados a personagens (principais e secundários) da história, sem contar que eram inspirados no livro que havíamos contado.
A turma logo se relacionou com os bonecos, colocando em suas mãos e brincando com a articulação da boca, principalmente com o movimento de morder. Não demorou muito para uma das crianças mais velhas perceber as semelhanças com os personagens da história e começar a reproduzir partes que a marcaram, como as conversas do coelho com a abelha. A partir da referência inicial, logo a turma começou a adicionar novos elementos e objetos nos fantoches de papel, mantendo algumas características dos personagens sem deixar de criar novas possibilidades.


Esse primeiro contato me possibilitou perceber relações de memória e criação, compreender parte do repertório de cada um e também observar os diferentes estágios de brincar de faz de conta da turma! Deu pra ver também como as crianças se relacionavam entre si, com quem se aproximavam para brincar, como lidavam com a situação de compartilhar o brinquedo, se apresentavam dificuldades em realizar o movimento de pinça… enfim, uma infinidade de possibilidades fundamentais para compreender as crianças, e tudo isso foi feito brincando com a situação de compartilhar o brinquedo, se apresentavam dificuldades em realizar o movimento de pinça… enfim, uma infinidade de possibilidades fundamentais para compreender as crianças, e tudo isso foi feito brincando com bonecos!
bonecos!
Aliás, este modelo de boneco de boca articulada e seu processo de construção também faz parte das propostas que desenvolvemos na Oficina de Teatro de Papel oferecida pelo coletivo no projeto Rede Formativa Peirô, ao longo de 2025, circulamos por 5 escolas públicas em Santa Maria, ministrando essa oficina para professores.

Já a segunda proposta que desenvolvi com a turma ao longo do primeiro mês de contato tinha uma cara mais “abstrata”, e pode ser chamada de “construção de personagens”. Baseada na história “Conte mais uma vez”, de Weberson Santiago. A história foi contada buscando o auxílio da turma para a contação a partir das imagens da obra, que brinca com a função desenvolvida por cada personagem, trocando papéis: “Era uma vez um bravo dragão, montado num cavaleiro, que atravessou vales e montanhas, enfrentou um ogro, derrotou uma princesa, capturou uma bruxa e salvou um cavalo do alto de uma torre.”


Após a contação, a turma foi convidada a construir seus próprios personagens usando rolinhos de papelão (daqueles molinhos mesmo, beeem conhecidos pelas profes) e canetinhas. Como já era esperado, as formas que surgiram nos rolinhos não eram idênticas às formadas dos personagens - nem perto disso - e em sua maioria eram identificáveis apenas os olhos e boca, mas permitiram que cada criança fizesse sua própria criação e brincasse com ela, e também me proporcionaram um espaço de observação dos grafismos produzidos.

A brincadeira começou repetindo as relações apresentadas pelas imagens do livro (que disponibilizei impressas e plastificadas para manuseio) e reproduzindo pequenas narrativas que invertiam os personagens de suas posições clássicas como na obra literária. Depois seguiu para um lugar de experimentação mais livre, criando pequenos enredos e novas relações entre os bonecos. O que mais me surpreendeu foi que a maioria das crianças foi capaz de desenhar um personagem (por exemplo, o cavalo) e manter sua narrativa com ele, apenas trocando suas posições como na história, o cavalo que foi desenhado lá no início sempre (ou na maioria das vezes) continuou sendo cavalo. Isso quer dizer que, mesmo sendo difícil para os adultos identificarem qual personagem era, as produções de cada um eram cheias de sentidos, de uma forma que eles eram plenamente capazes de identificar o que haviam tido a intencionalidade de fazer durante a criação.

Os bonecos de rolinho retornaram para a brincadeira ao longo da semana, e o nível de envolvimento com os bonecos foi crescente: não eram apenas rolinhos desenhados, eram bonecos que eles mesmos tinham feito! Viraram bonecos de colo, tinham voz, forma de andar… e ao final da semana acompanharam seus criadores para suas casas, continuando suas histórias.
Como professora, os bonecos me ajudaram a conhecer essas crianças e a me aproximar delas. Os bonecos tem essa magia: eles falam coisas que temos vergonha, mostram nossas vontades escondidas, e se tornam nossos companheiros.
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Até a próxima!


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